Ricardo Durães, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, lidera o estudo
Pesquisadores brasileiros, em colaboração com a Universidade de Hong Kong, identificaram pela primeira vez na América do Sul um novo coronavírus em morcego capturado no Ceará, com semelhanças ao Mers-CoV, vírus responsável pela Síndrome Respiratória do Oriente Médio. Além disso, os pesquisadores também identificaram o coronavírus HKU5, similar ao recentemente descrito na China. A descoberta inédita foi liderada pelo professor Ricardo Durães, da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp) - Campus São Paulo, com a aluna de doutorado Bruna Stefanie Silvério. O estudo foi publicado no periódico Journal of Medical Virology.
O ineditismo da pesquisa de Durães coloca o Brasil na vanguarda dos estudos sobre coronavírus emergentes, reforçando a relevância da colaboração internacional e do investimento em ciência para a prevenção de futuras epidemias e pandemias.
"Este estudo sublinha a importância crítica da vigilância e da epidemiologia molecular viral, bem como da cooperação científica na detecção de vírus emergentes. A descoberta desses coronavírus em morcegos no Brasil, não só expande nosso entendimento sobre a diversidade viral, mas também reforça a necessidade e a importância dessas abordagens para a prevenção de futuras epidemias e pandemias. Nosso trabalho conjunto com a Universidade de Hong Kong, em colaboração com o LACEN-CE, é um exemplo da importância das colaborações científicas para o avanço das pesquisas na área", explica Ricardo Durães, docente na Pós-Graduação e pesquisador dos Departamentos de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia, e de Morfologia e Genética da EPM/Unifesp.
Como foi feito o estudo
O trabalho identificou sete coronavírus (CoVs) distintos em morcegos, incluindo um intimamente relacionado ao causador da Mers – doença respiratória viral que matou mais de 800 pessoas em diversos países desde 2012. Esse novo coronavírus apresentou 82,8% de cobertura genômica em comparação com o Mers-CoV, evidenciando uma ligação evolutiva relevante. Para essa análise, foram aplicados ensaios moleculares, sequenciamento de RNA e análise evolutiva, técnicas avançadas que permitiram a caracterização detalhada dos vírus encontrados.
Análises da proteína spike revelaram altas similaridades com variantes de CoVs relacionadas ao Mers encontradas em humanos e camelos. Além disso, indicaram a presença de resíduos capazes de interagir com o receptor DPP4, o mesmo utilizado pelo Mers-CoV para entrar nas células humanas. Essa descoberta reforça a importância da vigilância ativa sobre os coronavírus circulantes em animais silvestres, uma vez que a proteína spike é fundamental para o potencial de transmissão em humanos.
"Ainda é cedo para confirmar se este vírus pode infectar humanos. Contudo, identificamos segmentos da proteína spike do vírus [responsável por se conectar à célula do mamífero e iniciar a infecção] que indicam uma possível interação com o mesmo receptor usado pelo Mers-CoV. Pretendemos conduzir experimentos em Hong Kong ainda este ano para explorar isso mais a fundo", reforça Bruna Silvério, primeira autora do estudo.
Vigilância contínua
Embora ainda não haja evidências de que esse novo coronavírus seja capaz de infectar humanos ou causar doenças, o estudo representa um avanço significativo na compreensão da ecologia viral dos morcegos na América do Sul. Análises adicionais estão planejadas para avaliar o potencial zoonótico deste vírus e compreender melhor sua evolução. A descoberta ressalta a necessidade de vigilância contínua e de iniciativas científicas conjuntas para antecipar e minimizar possíveis riscos à saúde pública global.
Fonte: UNIFESP